Caminho para Deus 225 – O que é a Fé?

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Como podemos definir a fé? É um sentimento? É um salto no vazio?

É um tranqüilizante para os meus problemas? A reflexão deste mês terá como centro compreender um pouco melhor o que é a fé, para que nossa fé seja uma fé mais madura, mais sólida, e assim possamos avançar mais seguros para a meta definitiva de nossa vida.

A confiança: uma atitude natural

O mundo de hoje muitas vezes questiona as pessoas que têm fé. Considera-as ingênuas, ilógicas, supersticiosas. Parece que para muitos homens e mulheres de nosso tempo é muito difícil crer em alguém sem poder vê-lo com os próprios olhos e tocá-lo com as próprias mãos.

Crer e confiar na palavra de outra pessoa é, contudo, algo natural e cotidiano; nem sequer o mais convencido ateu pode considerar-se um incrédulo absoluto, pois cada vez que adquire um produto ou um alimento confia nas pessoas que o elaboraram. Talvez não creia em Deus, mas no cotidiano “crerá” em muitíssimas coisas e pessoas sem estar constantemente analisando as razões para fazê-lo. Por exemplo, quantas vezes cremos, sem questionar, no que dizem os noticiários, os filmes, os jornais? Mais ainda, cremos nas pessoas que amamos, ou naquelas em quem reconhecemos certa autoridade, sem ter que estar verificando constantemente o que nos dizem. Seria realmente impossível viver duvidando de tudo o que nos dizem até que fosse demonstrado. O mundo, de certa maneira, ficaria paralisado.

Para o ser humano é natural crer e confiar, e a fé cristã, que implica em um ato similar pois é crença e confiança, é uma postura natural, que não torna os cristão nem ingênuos, nem tontos, nem ilógicos. Contudo, é compreensível que para temas mais transcendentes e misteriosos exijamos maiores razões, e é muito bom que seja assim.

Fé: dom de Deus e ato humano

A disposição natural das pessoas para crer e confiar encontra uma segurança e uma certeza muito grandes na virtude teologal da fé, porque é confiar em Deus, que nunca nos falha nem nos abandona, que não se engana e nem nos pode enganar.

O Catecismo da Igreja Católica nos diz que a fé é adesão pessoal do homem a Deus que nos criou a sua Imagem e Semelhança e, além disso, quis revelar-se, dar-se a conhecer. Deus «fala aos homens como amigo, movido por seu grande amor e mora com eles para convidá-los à comunhão consigo e recebê-los em sua companhia. A resposta adequada a este convite é a fé»[1]. Pela fé nós aceitamos a Deus que se revela, aceitamos seu convite para viver com Ele.

O Catecismo nos esclarece além disso, dando duas características muito importantes da fé:

a)      Em primeiro lugar afirma que a fé é uma graça, um «dom de Deus, uma virtude sobrenatural infundida por Ele»[2]. É um presente que Deus nos dá, manifestação imensa de seu amor. Deus nunca nega esse presente a quem o busca sinceramente e o pede com humildade.

b)      Por outro lado Deus respeita a liberdade do homem. A fé é também um ato humano, que depende da liberdade e da inteligência do homem que deposita sua confiança em Deus e se adere às verdades por Ele reveladas[3].

Recordemos sempre, então, que como todo dom divino, a iniciativa é de Deus, Ele nos ama primeiro e nos oferece a graça da fé que ilumina nosso entendimento e vontade. Como todo convite, espera uma resposta. Essa resposta ao dom da fé é a aceitação livre, o assentimento às verdades e promessas por Ele reveladas.

Isto nos leva a uma pergunta que provavelmente já nos fizemos alguma vez: e qual é o motivo pelo qual cremos? No fundo, como ensina o Catecismo, cremos graças à «autoridade do próprio Deus que se revela e que não pode nem enganar-se nem enganar-nos»[4].

Em linguagem coloquial dizemos que «cremos» em uma pessoa, ou botamos «fé» nela. Costumamos expressar-nos desta maneira quando manifestamos que podemos confiar nessa pessoa. Em geral é assim porque ela foi ganhando nossa confiança, nos demonstrou que era confiável. Algo similar, porém infinitamente superior, podemos dizer de Deus. Pela fé cremos em Deus e acreditamos nEle com uma certeza que ninguém mais do que Ele merece. A fé teologal é «mais certa que todo conhecimento humano porque está fundamentada na própria Palavra de Deus, que não pode mentir»[5].

Além disso, existem muitíssimas razões para crer. Argumentos que nos ajudam a fortalecer e anunciar nossa fé, como por exemplo: É impressionante como toda a Revelação de Deus ao longo da história tem um fio condutor e uma coerência maravilhosos: Cada acontecimento vai dando sentido ao anterior; por outro lado as verdades da fé se entrelaçam umas com as outras com uma harmonia misteriosa; os milagres foram confirmando muitas destas verdades de fé e são uma ajuda diante da nossa pouca fé. Tantos santos na Igreja também são uma garantia de que vivendo a fé se alcança a felicidade, etc…

A “Porta da Fé”

As palavras do Papa bento XVI, com as quais inicia a exortação apostólica Porta Fidei, na qual convoca o Ano da fé, recordam uma passagem dos Atos dos Apóstolos. São Paulo, depois de pregar o Evangelho em diversas cidades, deteve-se finalmente em Antioquia. Quando chegou «reuniram a Igreja e puseram-se a contar tudo quando Deus havia feito juntamente com eles, o modo como Deus tinha aberto a porta da fé aos pagãos» (At 14,27). A fé, diz o Papa, é como uma porta que nos introduz na vida de comunhão com Deus e, por sua vez, nos permite a entrada na Igreja.

A figura da porta nos fala da entrada, de início. Recorda-nos o ingresso em um novo tipo de vida, que acaba envolvendo todo o nosso ser. Não cruzamos o umbral da fé somente com uma compreensão teórica das verdades, mas quando acolhemos a graça de Deus e empreendemos um caminho de conversão total, que se manifesta em todas as dimensões de nossa vida. Cruza-se esse «umbral quando a Palavra de Deus é anunciada e o coração se deixa plasmar pela graça transformante», e supõe «empreender um caminho que dura toda a vida»[6]. É, nesse sentido, uma opção fundamental que alcança toda a nossa existência.

A fé é integral, que dizer, deve iluminar nossa mente, ser acolhida no coração, e  manifestada nas ações de nossa vida cotidiana. O Papa fala claramente: Ter fé no Senhor «não é um fato que interessa somente à nossa inteligência, a área do saber intelectual, mas é uma mudança que envolve a vida, a totalidade de nós mesmos: sentimento, coração, inteligência, vontade, corporeidade, emoções, relações humanas»[7].

A imagem da porta nos remete também, a umas palavras do Senhor Jesus sumamente esclarecedoras: «Em verdade, em verdade vos digo: eu sou a porta das ovelhas (…) se alguém entrar por mim, estará a salvo» (Jo, 10, 7.9).

Nós, cristãos, conhecemos de Deus o que nos foi revelado por Jesus Cristo: que Deus é Pai, Filho e Espírito Santo, um só Deus verdadeiro em três pessoas distintas, esse é o conteúdo essencial de nossa fé. Por isso, crer em Deus é inseparável de crer no Senhor Jesus, que nos reconcilia e salva. Deus se revela através de seu Filho e nos convida à comunhão, a viver como seus verdadeiros amigos.

A porta da fé se abre diante de nós para que possamos encontrar-nos com Cristo e segui-lo. Ele é «o caminho, a verdade e a vida» (Jo 14,6).

Caminhar e crescer na fé

Cruzar o umbral da porta da fé, contudo, não basta. Como vimos, o dom da fé implica uma resposta contínua para cultivar esse dom, já que se a fé não cresce, vai esfriando e vai desaparecendo. A fé, como diz Santo Agostinho, «se fortalece crendo»[8]. A vida de oração, recorrer aos sacramentos, tais como a Confissão e a Eucaristia, estudar os conteúdos da fé com o Catecismo, recorrer aos sacerdotes e pessoas com experiência, visitar Igrejas e santuários, são meios ao nosso alcance para caminhar e crescer na vida de fé. Mas acima de tudo isso necessitamos pedir ao Senhor o dom da fé, que nos ajude a fortalecê-la e aumentá-la.

Uma das grandes riquezas e ajudas da fé cristã é que caminhamos juntos como uma só família. Nenhum cristão avança sozinho pelo caminho da fé. Com membros da Igreja, apoiamo-nos uns nos outros e recebemos dEla as graças e auxílios que necessitamos “ até que cheguemos todos à unidade da fé e do conhecimento pleno do Filho de Deus, ao estado de homem perfeito, à maturidade da plenitude de Cristo (Ef 4,13). Juntos vamos nos aperfeiçoando. Por isso quando dizemos “creio” estamos dizendo ao mesmo tempo “cremos”.

Essa dimensão comunitária de nossa fé nos enche de alegria e esperança. Como diz o Catecismo: «eu não posso crer sem ser sustentado pela fé dos outros, e pela minha fé eu contribuo para sustentar a fé dos outros»[9].

Por outro lado, o cristão «não pode pensar nunca que crer é um ato privado»[10]. O mais natural é compartilhar o que cremos. Quando temos algo valioso, algo que vale a pena, contamos para nossos familiares, amigos e conhecidos. Assim como o sol não pode deixar de iluminar, aquele que carrega a chama de Cristo não pode escondê-la. E não se trata de ensinar uma teoria, mas de apresentá-lo como quem apresenta um amigo: “Te apresento a Jesus”, para que o outro possa dizer: “muito prazer em conhecê-lo”.

A fé, com efeito, explicava o Santo Padre, cresce quando é vivida como experiência de um amor que se recebe e se comunica como experiência de graça e felicidade. Torna-nos fecundos, porque enche o coração de esperança e permite um testemunho fecundo»[11].

PERGUNTAS PARA O DIÁLOGO

  1. O que é a fé?
  2. Que característica tem a fé?
  3. Como é a minha fé?
  4. O que posso fazer para fortalecer a minha fé?

 CITAÇÕES PARA A ORAÇÃO

  • O que é a fé: Jo 9, 36-38; Heb 11,1.
  • Pedir o dom da fé: Mc 9,23-24; Lc 17,5
  • Fé e salvação: Mt 9,22; Mt 8, 5-12.
  • Fortalecer nossa fé: Mt 17, 19-20; 1Pe 1, 6-9, 1Pe 1, 1-11
  • A fé se manifesta em obras: Tg 2, 14-24

 TRABALHO DE INTERIORIZAÇÃO

 Leia com atenção o seguinte texto e responda as perguntas:

«A fé é uma virtude teologal pela qual cremos em Deus e em tudo o que Ele nos disse e revelou, e que a Santa Igreja nos propõe porque Ele é a própria verdade. Pela fé “o homem de entrega inteira e livremente a Deus” (DV 5). Por isso o crente esforça-se por conhecer e fazer a vontade de Deus. “O justo viverá pela fé” (Rm 1, 17). A fé viva “atua pela caridade” (Gal 5,6)» (Catecismo da Igreja Católica, nº 1814.)

  • Explique com suas palavras o que é a fé segundo este número do catecismo.
  • Qual é a relação entre a fé e a caridade?

«Desde o começo de meu ministério como Sucessor de Pedro recordei a exigência de redescobrir o caminho da fé para iluminar de maneira cada vez mais clara a alegria e o entusiasmo renovado do encontro com Cristo (…). Hoje acontece com frequência que os cristão se preocupam muito com as consequências sociais, culturais e políticas de seu compromisso, ao mesmo tempo que continuam considerando a  fé como um pressuposto óbvio da vida comum» (Bento XVI, Porta Fidei, 2)

  • Como está a sua fé?
  • O que você pode fazer para que sua fé cresça?

Leia e medite na seguinte passagem bíblica e depois faça uma oração pedindo ao Senhor que ajude você a crescer na fé.

«Jesus lhe disse: “Se podes!… Tudo é possível para quem tem fé”. O pai do menino gritou: “Eu tenho fé, mas ajuda a minha falta de fé”. (Mc 9,23-24)


[1] Ver Catecismo da Igreja Católica, nº 142

[2] Catecismo da Igreja Católica, nº 153

[3] Catecismo da Igreja Católica, nº 154

[4] Catecismo da Igreja Católica, nº 156

[5] Catecismo da Igreja Católica, nº 157

[6] Bento XVI, Porta Fidei,1.

[7] Bento XVI, Audiência Geral, 17/10/2012.

[8] Santo Agostinho, Da utilidade de crer, 1, 2.

[9] Catecismo da Igreja Católica, nº 166

[10] Bento XVI, Porta Fidei,  10

[11] Bento XVI, Porta Fidei,  7

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